Quando a própria história de vida se torna objeto de pesquisa, cada lembrança se transforma em conhecimento e cada desafio em contribuição para o futuro. Foi assim que Débora Nolasco, professora surda do Acre, defendeu sua dissertação de mestrado, encontrando em sua trajetória tanto inspiração quanto relevância para o estudo.
Débora, que atua na rede estadual como professora no Centro de Apoio ao Surdo (CAS), instituição vinculada à Secretaria de Estado de Educação e Cultura (SEE), especializada no atendimento e inclusão de estudantes surdos, apresentou no último dia 17 sua dissertação intitulada “Educação de Surdos em Rio Branco na Década de 80: uma Perspectiva Autoetnográfica”. A pesquisa foi aprovada com êxito pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Acre (Ufac).

“Refleti bastante sobre o tema da pesquisa e decidi focar no Acre, pois queria valorizar a história da educação de surdos no meu estado. Esse mestrado é muito significativo para mim, pois resgata memórias da minha infância e trajetória educacional. Desde criança, enfrentei desafios por ser surda, especialmente na escola”, relata a professora Débora Nolasco.
Sua vida é um reflexo da história da educação da população surda no Acre. De acordo com sua pesquisa, na década de 1980, o ensino para surdos em Rio Branco era influenciado pela Igreja Católica e seguia o método do oralismo, que obrigava os alunos a utilizar a fala. “Comecei a estudar em uma escola católica, o Instituto Imaculada Conceição, quando tinha cerca de 9 ou 10 anos. Lá, conheci outras crianças surdas, mas a comunicação era difícil”, relembra.
Foi nesse período que a escola, percebendo as dificuldades dos estudantes, buscou apoio da igreja para levantar fundos e enviar a professora responsável pela turma ao Instituto Benjamin Constant, no Rio de Janeiro. Lá, ela realizou cursos sobre a Língua de Sinais. Ao retornar, compartilhou o conhecimento adquirido, dando início à introdução da comunicação por sinais em sala de aula.
Ao longo da dissertação, a pesquisadora não apenas aborda as dificuldades enfrentadas, mas também os avanços da época. Foram essas vivências que serviram de combustível para sua evolução profissional. “Quando terminei o ensino médio, percebi que queria me tornar professora para ajudar outros alunos surdos a não passarem pelas mesmas dificuldades que eu enfrentei. Descobri que tinha vocação para ensinar e compartilhar conhecimento”, reflete.

A pesquisa também foi influenciada pela experiência que Débora acumulou ao longo de sua trajetória como professora. “Trabalhando no CAS, percebo o impacto do meu trabalho na vida dos alunos. Muitas crianças me veem como uma referência e dizem que querem ser como eu quando crescerem. Isso me motiva ainda mais a continuar lutando pela educação dos surdos”, compartilha.
A dissertação de mestrado foi orientada pelos professores Alexandre Melo de Sousa e Nádson Araújo dos Santos, ambos da Ufac, e Felipe Aleixo, da Universidade Federal de Roraima (UFRR). Atualmente, o trabalho está na fase de correção final e, em breve, estará disponível ao público. Para Débora, sua pesquisa pode contribuir para que gestores, professores e pesquisadores compreendam melhor a trajetória da educação de surdos no estado. “Quem ler minha pesquisa poderá ampliar sua visão sobre o tema e buscar melhorias na inclusão”, afirma.
Redação Semear Notícias